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Pais de menina, morta há 4 anos vítima de bala perdida em Belford Roxo, querem criar ONG.

Priscila Barros e Adenildo Firmino perderam sua filha Geovana Vitória durante assalto em Belford Roxo e, após incidente, tiveram as gêmeas Geovana e Vitória Foto: Agência O Globo/Domingos Peixoto
A notícia, na televisão, sobre a morte de Sofia Lara Braga, de 2 anos, no último domingo, vítima de uma bala perdida enquanto brincava dentro de uma lanchonete em Irajá, fez um filme passar pela cabeça da boleira Priscila Firmino. Em 2013, também no dia 22 de janeiro, sua filha Geovanna Vitória, que acabara de completar 1 ano, morreu ao ser baleada em um assalto a caminho de casa, em Belford Roxo, na Baixada Fluminense.

— Quando soube da morte de Sofia fiquei estática. Eu estava vivendo tudo aquilo de novo. Vi o pai correndo com ela nos braços e lembrei de mim mesma tirando minha filha do carro e a levando para o hospital. Fiquei com aquilo no meu coração, quis falar com a mãe de Sofia — contou a boleira, de 31 anos, vestida com uma camiseta com o retrato de Geovanna Vitória.

O marido de Priscila, o autônomo Adenildo Firmino, de 34 anos, chegou a tentar contato com o pai de Sofia, o policial militar Felipe Fernandes, por meio de uma rede social, mas não obteve retorno:
— Sei que é recente, entendo que eles não queiram contato algum. Após uma tragédia como a que eles passaram, você não quer ver ninguém. Mas queremos muito encontrar esse casal, para tentar dar conforto, falar do nosso sofrimento — afirma Adenildo, vestido com a mesma camiseta que a mulher.

O desejo de Priscila e Adenildo é ainda maior. Eles querem fundar uma ONG para dar suporte a todos os pais que perderam seus filhos para a violência do Rio.

— Passamos pela mesma situação e nos sentimos no dever de dar uma palavra, abraçar, ajudar. Queremos fazer um espaço aqui, em Belford Roxo, para dar assistência psicológica e espiritual, oferecer oficinas de artesanato para distrair a cabeça — lista Priscila, que, quando perdeu a filha, teve o apoio da ONG Rio de Paz. — A gente estava passando por um processo muito difícil, eles ajudaram psicologicamente, na reforma da nossa casa… 

Precisei desse suporte para conseguir estar de pé hoje. Agora, quero retribuir.

Priscila conta que, logo que Geovanna Vitória morreu, ela chegou a pensar em se matar:

— A vida tinha perdido sentido para mim. Ela foi muito desejada, nós a esperamos por 11 anos, e foi tomada da gente de uma forma tão cruel... O que você mais pensa é em coisas ruins, em morrer. É como se você entrasse em um buraco sem saída. Se não fosse Deus na minha vida, eu não estaria aqui.

Dois meses depois da perda, em 18 de janeiro de 2013, Priscila descobriu que estava grávida de gêmeas. As meninas nasceram no dia 15 de outubro e foram batizadas de Geovanna e Vitória.

— Não há caso de gêmeos na minha família ou na do meu marido. Foi uma bênção de Deus, eu perdi uma filha e ganhei duas. A partir deste momento, voltei a ter forças para viver. Vi que tinha dois seres dentro da minha barriga que precisavam de mim. Se eu fizesse alguma besteira, elas estariam pagando também — disse Priscila.

Sapecas, Geovanna e Vitória, hoje com 3 anos, são as alegrias da casa. Quando a equipe do GLOBO chegou, logo recebeu um convite.

— Querem conhecer o meu quarto e ver “meu sandálio” da escola? — perguntou Vitória, a mais extrovertida, que, em seguida, se vestiu de Mulher Maravilha para posar para as fotos.

Mais reservada, mas não menos vaidosa, Geovanna se vestiu de Elsa, personagem do filme “Frozen”, e disparou:

— Vou estudar para ser fisioterapeuta e cuidar do papai — disse a menina, que entrará na escola com a irmã na semana que vem.

Adenildo diz que a chegada da pequena dupla “mudou muita coisa” na vida do casal:

— Nada substituiu a que foi, mas é uma felicidade. Falar é difícil. O choro pode durar um dia inteiro, mas a alegria vem pela manhã.

 
Há várias fotos de Geovanna Vitória espalhadas pela residência da família. Priscila e Adenildo fizeram questão de contar para as meninas sobre a “irmãzinha que mora no céu”.

— Elas veem as fotos e perguntam: “Mamãe, bebezinho?”. Aí eu converso, e elas dizem: “Muito linda a irmãzinha que mora no céu”. Pode ser que, na escola, quando elas crescerem, os colegas perguntem, porque a história está na internet. E queremos que elas saibam lidar com isso — afirma Priscila.

Segundo levantamento da ONG Rio de Paz, 31 crianças morreram após serem atingidas por balas perdidas nos últimos dez anos no Rio; 18 apenas nos últimos dois. Na segunda-feira passada, após a morte de Sofia, a entidade fez um protesto na Praia de Copacabana com os nomes de todas as vítimas.

— Tenho uma filha de 6 anos. Não podia abraçá-la e ficar calado enquanto um cidadão teve o mesmo direito violado 
— disse o fundador da Rio de Paz, Antônio Carlos Costa.

Para ele, a profusão de casos é “fruto da incompetência do poder público e da indiferença da sociedade”:

— É inaceitável que essa criança esteja morta perante o silêncio da sociedade e dos governantes. É preciso que a guerra às drogas entre em pauta e que a desigualdade social seja combatida. As pessoas têm que entender que defender o direito de um é defender o direito de todos.
Fonte: Natália Boere - O Globo/Extra
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